Wednesday, February 04, 2004

The definitive goodbye.

soundtrack interna: "lerê, lerê, lerêlerê lerêêê..."
Ok, já deu pra notar que eu estava no trabalho. And not so suddenly, the phone rings.

- É pra você.
- ...
- Alô? - digo eu, incerta. Ninguém liga pro meu trabalho. Me preparo para a notícia de que minha mãe teve uma crise de septicemia aguda e bateu as botinas.
- Está nervosinha? - é a voz dele. Adolf. Consigo ouvir o risinho-de-canto-de-boca que ele nem deu ainda. E continua:
- Você sempre fica nervosinha quando eu te ligo aqui no trabalho (o detalhe interessante é que essa foi apenas a SEGUNDA vez que ele fez isso, e já se sente capaz de traçar um padrão de comportamento... Pfe).

- Eu não estou nervosa, só estou ocupada (isso, garota, DESTRÓI ELE).
- E eu só liguei pra dar sinal de vida ("quem pediu?", é a pergunta que não calaria, se eu não a tivesse engolido feito uma colherada de óleo de rícino). Faz tempo que eu não te ligo... (detalhe 2: ele não ligava pra minha casa há dois dias, quando é natural ficar quase uma semana sem telefonar)

- Hm.
- É que meu telefone está mudo, e com esse calor eu não tenho coragem de sair pra ligar da rua (sim, mas EU posso sair às ruas para trabalhar, enquanto ele fica at home fritando batatas e ouvindo Pink Floyd). Resolvi engajar no papo:
- Se deixasse pra ligar pra minha casa não ia me achar hoje. Saindo daqui eu vou ao Norte Shopping pagar a fatura da Renner.
- Por que no Norte Shopping??
- Porque na nossa cidade não tem loja da Renner, claro. E só se pode pagar faturas de lá nas próprias lojas. Vou pegar uma kombi, porque aqui perto do trabalho não passa ônibus pro Norte Shopping, e...
- Deixa eu desligar antes que eu me aborreça mais. Você faz TU-DO errado!
- O que há de errado em ir pagar uma fatura???
- De Kombi?? Aí na capital? Você vai tomar um tiro na testa antes das seis da tarde hoje, espero que tenha tempo de se lembrar dessa minha profecia, quando ela se cumprir.

E aí ele reclama mais um pouco até desligar.

Eu deposito o fone no gancho e volto para a minha mesa, pensativa. Noutros tempos eu teria ficado feliz. Noutras, triste. Mas o que tem pra hoje é um misto de indiferença e decepção. Essas atitudes que fariam algumas meninas vibrar de felicidade pela "preocupação e zêlo" demonstrados só asfaltam mais um metro da estrada que me afasta daquilo que eu pensava ser a perfeição. Estou caminhando pra longe e, como tenho um péssimo senso espacial (consigo me perder dentro de uma casa de cinco cômodos), é provável que, uma vez longe, eu esqueça o caminho de volta.

Isso não é preocupação, nem zêlo. É neurose. Psicose maníaco-obsessiva. Isso precisa de tratamento médico - e não da minha condescendência forçada.

E eu ainda estava na rua quando ele ligou pra minha casa, a mãe disse. Se pra se desculpar, ou reclamar mais, ou saber se a tal bala perdida havia encontrado um lar na minha cabeça, não sei. Nunca vou saber, porque não vou perguntar, porque não quero saber e porque não importa mais.

O definitivo adeus do amor é o poema

Foste ausente e eu cumpri, com a cínica resignação
de conhecido o caminho, o urbano rito de perder-te.
Tu sabes. Fiz-te um brinde solene, depois outro...
Depois muitos, até que tu não mais me doías
e eu fui morrer de frio num outro braço.

Mas a todas estas coisas fiz cumprir de olhos secos,
e vesti-me de amargura como de preto as viúvas:
por adequado o traje, não o luto.

Enfim, eis os teus irreversíveis versos.

Limpamo-nos um do outro sem maior dano
que acrescentar descrença a um sonho já roto.
Não houve fotografia para rasgar, nem um cão que
sinta tua falta ou crianças para dividir. Nenhum amigo
lamentará nosso triste fim ou servirá de memória do que fomos.

Pouco existimos um para o outro;
pouco, muito pouco eu partilhei contigo
além de toda poesia que existe no mundo.

Não sei desesperar mesmo quando desespero.

Ai, poeta, se eu soubesse.
Eu te juro, rasgava o vestido,
arrancava os cabelos, e de joelhos
eu te pedia (em alexandrinos),
pra não ires embora de mim.

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